domingo, 27 de fevereiro de 2011

Palavras não vêm facilmente

Não conseguia mais fingir a mascara de fortaleza inabalável, que normalmente ostentava na frente de todos, para poder ter seu ar de arrogância e superioridade costumeiro. Seu corpo já não funcionava como em outrora, pois estava quase impossível dizer onde cada órgão se localizava e tinha uma certeza, quase que fiel, que todos eles haviam se fundido, tendo em vista sua perda de consistência do mal estar. Nunca tinha lido o Mágico de OZ, porém certa vez haviam lhe contado a historia do homem de lata. Como aquele ser podia ter sido tão estúpido, ao ponto de pedir para o mago um coração. Tudo bem que o mago não lhe deu um, pois ele já o tinha, porém a tomada de consciência seria o problema futuro, e com certeza, em um prazo de seis meses ele iria se arrepender, mas já seria tarde de mais, e a situação já estaria irremediável. Coração, órgão humano historicamente responsabilizado pelas tormentas emocionais, mas que em sua opinião era apenas uma espécie de sindicalista, um fogueteiro grevista, que fazia com que todos os outros órgãos se revoltassem e se fundissem para produzir o mal estar. Mas no ponto em que se encontrava, não adiantava encontrar culpados. As horas passavam e o sentimento de incomodo só aumentava, tinham combinado de se encontrar as vinte horas, e já contabilizava um atraso de quinze minutos. Quinze minutos de ensaio, para quem tinha passado dois dias, não representava nem a preparação para o epílogo. No ensaio, assim como em uma seção de psicodrama, tinha conseguido falar tudo sem pestanejar nem mudar as palavras para sinónimos eufêmicos. O atraso já se contabilizava em vinte minutos, tempo inadmissível, mesmo que estivessem em período chuvoso. Será que havia se arrependido? Iria esperar fechar a meia hora de atraso, para poder ir embora. Ao longe, mesmo sem óculos, pode notar, não pela silhueta, mas pela maneira como andava, que a pessoa tão esperada enfim chegara. À distância em que se encontravam ainda lhe proporcionaria mais alguns minutos de decisão combustiva. Na hora da escolha tudo se tornava mais confuso e perturbador, e todas as certezas se diluíam em pensamentos ondulados que colocavam em prova a lógica tão certa. A Lei da relatividade estava contra seus pensamentos, e em algumas passos, os dois olhares iriam se cruzar. Nunca tinha sido seu forte se arrepender de escolhas feitas com muita reflexão, mas se a certeza ainda não era forte o suficiente, para se consolidar na presença do outro, admitir e aceitar a queda de sua arrogância era o melhor a ser feito. Antes que os passos que permitissem a decisão fossem recolhidos a zero, virou-se bruscamente e foi o mais rápido possível, sem olhar para traz, em direção a multidão, pois, assim, iria se diluir e ser apenas mais um. Tudo foi tão rápido que só quando realizou todas as ações, foi que o cérebro, agora um pouco mais calmo e duas vezes mais confuso, concebeu o que acabara de ordenar para o resto do corpo. O mal estar tinha se acalmado, por pouco tempo, e sabia que quando toda aquela adrenalina fosse metabolizada pelo corpo, ele iria voltar. Tinhas as desculpas necessárias, e as mentiras programadas para se defender de sua ausência do encontro, e isso lhe proporcionava um conforto mínimo, para mais um dia de pensamento.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Fim de Sísifo

Às vezes, quando as palavras faltavam, o silêncio podia ser usado como desculpa. Porém nem sempre silenciar era a melhor forma, pois quando ficava em silêncio, sua voz ecoava dentro de sua cabeça perturbando suas vontades e sonhos. Aprendera que devia falar o que pensava, e o fato de se machucar era apenas uma questão de ponto de vista, pois sempre teria uma pequena ferida a ser curada. Uma ferida, que mesmo sem ser percebida insistiria em doer, incomodar sem resolver cicatrizar. Quando se encontraram, seus pensamentos fugiram imediatamente de sua cabeça, como balões de gás hélio que sobem ao céu, no imediato momento que são libertados das mão de uma criança. O silêncio novamente era o rei da ocasião, e dentro do castelo do rei se abrigavam vários seres que podiam a qualquer momento serem expulso, tendo em vista que o espaço dentro das muralhas de dentes se tornava cada vez menos. De alguma forma os pensamentos voltavam lentamente a serem respirados, mas o silêncio, ainda não havia sido quebrado. Os olhares, as mãos, os corpos, as bocas, os toques, os silêncios. Os lábios cerravam, porque eram os únicos que tentavam parar o impulso, sabiam que não seriam fortes o suficiente, porém o pouco que tempo que pudessem impedir já serviam ao menos como uma esperança prostituída. Já serrados e a poucos segundos de abrirem, cansaram e cederam. O ar decidido que sai do pulmão, passava pelas traquéias, encontrava com as cordas vocais e por fim formavam os fonemas na boca. Responsável pela quebra total silêncio? Entretanto sua força não fora suficiente para ser considerada um grito de libertação. Os olhos perceberam que nada havia acontecido, por isso, todo o corpo se reorganizou para refazer o esforço semelhante ao trabalho de Sísifo. As sílabas subiam pela sua garganta como pedras, mas ao chegarem a boca fora expulsas e dessa vez puderam ser ouvidas em bom som. Eu ess-stuo a-paixo-nado p-o-or voc-ceeê.