quinta-feira, 29 de julho de 2010

A viagem

(Começa a cena com um barulho de barco saindo do porto, mulher sentada em uma pedra acenando com o lenço, e o marido olhando na mesma direção, porém sem se despedir e sem demonstrar nenhum sentimento)

Marie: Harry, isso é mesmo necessário?

Harry: Mesmo que não fosse, não temos mais nada a fazer, o barco já esta saindo! E ele já está embarcado.

Marie: Querido, é o nosso filho que esta lá dentro. Tenho tanto medo do que possa acontecer com ele.

Harry: Não temos outra opção. O governo inglês esta obrigando todas as pessoas que possuem filhos, com o mesmo problema que o nosso, a embarcá-los o mais rápido possível nesse barco.

Marie: Mas Harry, só o nome já me dá calafrios. Nau dos Loucos. O nosso filho não é louco. Harry, isso eu tenho certeza, pois fui eu que dei a luz. Harry, fui eu que amamentei, fui eu que cuidei dele durante todo esse tempo, era eu que estava sempre lá, e não esse povo que faz as leis. (tom raivoso) Ele é apenas diferente dos outros meninos da mesma idade.

Harry: Marie, não há mais o que fazer; o barco já vai partir e não adianta ficar reclamando isso para mim. Ordem do governo é ordem do governo e isso não se discute, é melhor assim. (tom conclusivo).

Marie: Você não me entende mesmo? Olha só para essas pessoas que estão sendo empurradas! Empurradas, pois esses ditos “médicos” não têm nem um cuidado com eles. E isso é porque estamos olhando, imagina só quando estiverem só eles lá dentro. Como será que vão cuidar do nosso filho? Com certeza não vai ser com a mesma atenção que uma mãe tem para com seu filho. E fora que o nosso filho não se parece com nenhum deles que estão ai. (olha fixamente para um ponto, e começa a demonstrar nervosismo) Olha, Harry, aquele senhor ali não é o ladrão que estava sendo procurado pela policia na semana passada? Tenho certeza, é ele sim! É ele! Olha.

Harry: Acho que não deve ser querida (tom de conforto, porém com dúvida). Você já está muito cansada, é melhor irmos indo embora. (Marie balança a cabeça de forma negativa) Acalme-se, o governo falou que essa viagem é apenas por um breve período, e que logo logo ele volta. Vai apenas passar por um tratamento mais forte, quem sabe não seja melhor para todos nos, pois assim ele vai ficar normal como todas as outras pessoas.

Marie: Não, Harry, não é assim como você pensa e fala. Ele não está viajando a passeio, ele está sendo obrigado a ir, e o governo não nos dá nenhuma garantia de sua volta. Ele é o meu filho, meu filho, meu filho... (vai aumentando o tom até estar gritando desesperadamente).

Harry: Você quer dizer nosso filho, não é? Você acha mesmo que estou feliz? Não é tão fácil como eu demonstro. Mas ele estando junto de nos também não eramos muito felizes, nunca podíamos sair juntos, sem perder o olhar crítico da sociedade

Marie: (interrompendo o marido) Esse eu tenho certeza, é um dos ladrões que estavam sendo procurados pela polícia! (nervosa) Isso não esta certo, vão colocar nosso filho junto com esse ladrão? Não era para ser um tratamento? Como isso vai ocorrer? Não, Harry, isso não ta certo!

Harry: Para de falar besteira, deve ser alguém parecido, com certeza o governo não iria fazer isso... Misturar ladrões com pessoas que possuem esse pequeno problema.

Marie: Se você não se importa com o nosso filho, tudo bem, mas eu já estou cansada!

Harry: (tom grosseiro) Não vou mais perder tempo com você, vamos, pois o que está feito esta feito, agora é só deixar de pensar besteira e ir esperando os dias passarem com paciência. Além do mais você ainda tem outros dois filhos para cuidar, e é melhor cuidar para eles não ficarem loucos que nem esse (depois de falar louco faz uma expressão de quem falou uma palavra que não se deve pronunciar).

Marie: Louco? Você chamou nosso filho de louco? Francamente, Harry, o que vão pensar de nossa família se alguém ouvir você falar isso? E logo você que me obrigou a mentir para todo mundo sobre o destino da viagem do nosso filho.

Harry: (notoriamente nervoso pelo comentário da mulher, fala com um tom de finalização) Vamos, não há mais nada a fazer aqui, quanto mais tempo ficarmos pior para a nossa imagem. Agora é só rezar para que ele volte melhor do que foi e o mais rápido possível.

(Harry olha na direção do barco com um olhar de despedida, sai da cena e da coxia, chama a esposa. Marie sai com o olhar baixo, pois não consegue disfarçar a tristeza)

Sol Poente.

(Uma mulher sentada mexendo em um som, enquanto o homem estar olhando para ela deitado na cama.)

Izabel: Olha nego é nossa musica vamos dançar? Eita que eu me sinto toda acariciada, por você, só de ouvir essa musica! Vamos nego vem dançar!
(Zeca se levanta da cama e vai dançar junto da mulher, musica a ser escolhida pelo grupo, porem deixo como diga a musica, “Despedida” de Maria Rita)
Zeca: Bel, tenho uma coisa para te dizer. Mas não sei como começar. (fala enquanto dançam)
Izabel: Fala homem, tu sabe que entre nos não tem essa besteira. Fala logo.
Zeca: Bel, tu sabe por que eu vim para cá né? Vim a trabalho, transferido, e a vida de quem trabalha na marinha é assim, o governo é que escolhe nossa casa, nossa cultura, nossa família.
Izabel: (vai até o som e para a musica) Nego, não to gostando do caminho que essa conversa ta seguindo fala logo, ou cala de vez.
Zeca: Eu também não sou de arrodeios, mas é que tu sabe como gosto de você...
Izabel: Fala logo, você mesmo falou que não é de arrodeios.
Zeca: É que bel... Izabel.
Izabel: (cortando a fala em um tom de raiva) Izabel? E tu me chama assim dez de quando? A única vez que você me chamou assim foi quando nos conhecemos e eu te falei que Izabel era para os desconhecidos e Bel era para os íntimos (leve sorriso) e como tu é safado foi logo me chamando de Bel e com o passar do tempo ficou B. Fala logo que eu já sei que coisa boa não é!
Zeca: Bel, verdadeiramente não é coisa boa, o que tenho para lhe dizer é que eu fui transferido para outra cidade.
Izabel: Mas home deixa de ser bobo nos ainda podemos nos ver. É onde? 200 km?
Zeca: Não Bel é no sul do país, e não temos como nos ver. É muito longe, eu não tenho como ficar vindo, você não vai ter como ficar indo. Entre outros problemas...
Izabel: Mas Zeca, eu vou com você, não a nada aqui que me prenda mesmo, nem família nem amigos, só tu mesmo, para mim essa terra é só tu (risada nervosa)
Zeca: Izabel não... Não quero desandar tua vida! Mulher vida de marinheiro é sem rumo, sempre se mudando. Eu mesmo achei que ia passar no mínimo dois anos aqui, e com menos de seis meses já fui transferido. Você tem é que ficar aqui. Sua terra. E não ficar mulher do mar.
Izabel: Desandar minha vida? Não homem isso não é problema ela já é toda desandada desde sempre mesmo. Eu sempre tive uma vida desandada! Estando com você é que eu sinto que ela pode andar um pouquinho, e mesmo se ela não andar eu não me importo muito. Por mim ela pode até nadar (risada nervosa).
Zeca: Não Izabel, você tem que entender, eu tenho de ir e você de ficar.
Izabel: É verdade, mulher de marinheiro é pior que puta, ou menos as putas recebem dinheiro pelos homens que passam por elas, e nos mulher de marinheiro, não essas só fica com a fama na cidade. E homem já gente vai a gente fica.
Zeca: Você sabe que se eu pudesse eu ficava aqui, mas são ordens superiores, e ordens superiores não podem ser desobedecidas.
Izabel: Homem, então se você vai sair da minha vida saia logo agora. Borá fora... Esse barraco é pequeno, mas é meu... Fora... Fora ta ouvindo não. A partir de agora só me fode se pude pagar.
Zeca: Calma, também não precisa ser assim... Ainda nos gostamos...
Izabel: Exatamente por isso tem de ser assim, vamos homem sai... Já que tem que ir vai logo.
(Izabel esperando ele sair segurando firmemente a expressão de mulher decidida, depois que ele sai ela coloca novamente a musica e começa a rir risadas)