Eram por volta das duas da manhã, os dois tinham resolvido
sair de casa para andar um pouco. Não juntos, claro, pois nesse momento inicial
da historia eles ainda não se conhecem. As ruas que escolheram para passear não eram
as melhores. Ruas escuras, mal iluminadas e com muitos locais de esbornia. Não
que sejamos contra a esbornia, mas locais, assim, não parecem propícios para os
acontecimentos que vão se encadear. Os dois, ao verem-se de longe, pensaram não
serem da mesma cidade e, entre uma risada e outra, foram descobrindo serem
quase vizinhos. Talvez fosse tenso, principalmente para um deles, saber que
eram tão próximos, pois, assim, seu segredo, ou melhor, seu instinto podia ser
revelado. Em quanto andavam pelas ruas de esbornia, conversavam e riam tão
distraidamente que aos poucos e, talvez, sem perceber já não tinham mais o medo
inicial e pequenas porções de confidencias foram trocadas. O engraçado era que eles
tinham quase a mesma idade, os signos eram bem diferentes, mas segundo o horóscopo
havia grande possibilidade de combinação, e juntos riam tanto que o sorriso
certamente seria o que mais iria marca-los. Entre conversas bobas e confissões
intimas, junto com um desejo mutuo, as horas foram passando e o dia estava
quase vindo à tona. Com a chegada do dia já se anunciando entre risadas tímidas,
pensamentos altos e risadas bobas tinham que se despedir. O estranho é que não
parecia mais que tinham se conhecido em um local onde o mais provável de
acontecer era o sexo rápido e sem compromisso. Esse fato só ainda podia ser
lembrado, quando um dos dois puxava na memoria a hora que tinha visto o outro
de costa e reparou que tinha uma linda bunda. Não que esse fato não fosse mais
tão importante, mas agora ele era apenas mais uma memoria, que era importante,
mas tão quando as lembranças dos sorrisos bobos e da boca vermelha. Com o
passar de horas de fala, minutos de silêncios e segundos de trocas de olhares
tinham que se despedir. Possivelmente, como uma forma de marcarem o compromisso
de se reverem, pensaram em trocar uma musica. O jogo iria funcionar da seguinte
forma: cada um iria dizer uma musica para o outro ouvir. Assim, por meio da
musica, iriam ter uma forma de lembrar um do outro, e certamente, a vontade de
estar perto iria ser atiçada. Não que precisassem de uma musica para atiçar
essa vontade, mas seria muito mais uma maneira de ter perto, o que estava
longe. Trocaram as musicas, olharam-se por mais alguns minutos, riram por mais
alguns segundos e também silenciaram, deixando apenas o olhar no ár. Já era
tarde da noite, ou melhor, cedo do dia, tinham que se despedir, pensando bem,
tinham que dar um até breve, um nos vemos amanha, um não quero perder o
contato, um não suma... Já estavam começando a se distanciar e seguir seus
devidos caminhos, de volta para casa, quando um deles virou-se e entre mais uma
risada disse: “Xero”. O outro também rindo, repetiu a palavra, pois havia
achado uma forma carinhosa de se despedirem. Ao virarem-se de costas, colocaram
o fone no ouvido e como em uma cena aonde a câmera vai subindo e o foco vai
saindo dos personagens principais da historia e expandindo para mostrar o resto
da cidade, deram um até breve mentalmente e guardaram na memória os sorrisos
bobos, os olhares, a musica , o silencio, os segredos e o “xero”.
quinta-feira, 28 de março de 2013
quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013
Wicked Games
A maioria dos presentes ainda
estavam nas caixas, o vestido branco e o penteado no cabelo ainda não tinham
sido tirados. Ela, sozinha, em casa sentou entre as caixas e começou a
desembrulhar. Um liquidificador, conjunto de facas, toalha de mesa e pequenos
objetos de decoração. A casa era linda, assim como tinha sido o casamento. Não
era o primeiro, mas como nunca havia casado no religioso, dessa vez, resolveu
fazer como manda os planos sociais. Não fora na igreja, única coisa que ela
havia resolvido fazer diferente, pois desde criança tinha a vontade de casar na
praia. Como via nos filmes da sessão da tarde. Não tinha sido uma cerimonia
para muitas pessoas, porém os mais próximos do casal estavam lá. Tudo perfeito,
tudo como em seu sonho de menina “fairy tales”. Mas agora com a festa desfeita,
as caixas empilhadas sobre a mesa e outras no chão, seus pensamentos não a
deixava sentir-se feliz. Ao pensar na felicidade, lembrava rapidamente da
infância, pois era nesse período da vida que pouco era motivo para muita
alegria ou tristeza profunda. Quando era criança, os sentimentos variavam muito
rapidamente, porém tudo era novo então até mesmo ficar triste por perder um
brinquedo, era uma possibilidade de descobrir outras formas de se divertir.
Porém sentada na sala arrumando os presentes, o mais perto de diversão que
conseguia ter era ver qual o presente que seus familiares miseráveis haviam
comprado. Não era seu primeiro casamento, em ordem cronológica seria o segundo,
fora umas duas ou três vezes que chegou a morar junto, mas sem oficializar o
casamento. O último havia lhe deixado tantas marcas que mesmo estando começando
uma nova relação, ela ainda não tinha todos os sentimentos recuperados e em
ordem. Já cansada, desistiu de desembrulhar os presentes, pois em vez de ficar
feliz por estar montando a sua nova casa, coisa que normalmente as noivas
parecem ficar em filmes, ela estava ficando cada vez mais em duvida. Ao sair do
meio te todos os presente, percebeu estar de frente ao espelho. Talvez ela conseguisse mentir para se mesma,
mas o espelho não tinha essa obrigação, por isso ele fazia questão de mostrar a
maquiagem borrada pelo choro, que ela fingia não escorrer pelo rosto. Ao ver o
vestido brando todo amassado e o rosto de maquiagem espalhadas, pelas compulsivas
vezes que levou a mão ao rosto para limpas as lagrimas, ela assumiu as lagrimas
e ficou olhando elas escorrerem pelo rosto e mancharem mais a gola. Assumir
para sim um fracasso é talvez mais difícil que assumir para os outros, ou seria
tudo um montante, pois ás vezes não se assume o fracasso com medo do que os
outros podem dizer, foi o que ela ficou pensando. Havia gasto tanto pela a
festa de casamento, dito a tantas pessoas que estava feliz, e que havia
novamente encontrado uma pessoa para dividir tudo, que assumir que não estava
feliz era algo muito difícil. Mas entre o rosto amassado e o vestido sujo ela
sabia que não estava feliz, pois era necessário um por favor para que eles se
beijarem, uma briga para conseguir que tivessem sexo e muito cuidado para
expressar carinhos. É realmente as pessoas mudam, era o que as lagrimas expressavam,
enquanto sujavam o rosto. Sentada em uma
caixa, que provavelmente fosse a da televisão de plasma, e já sem lagrimas para
chorar, mas com um copo de vodca para acompanhar, ela pegou o primeiro papel de
presente, que tinha o verso em branco, e com a caneta preta ,que falhava um
pouco, escreveu. “Saiba que quando eu disse sim eu estava disposta a dar tudo
de mim. Então me diga que você me ama, mesmo que você não diga isso a ninguém,
mesmo que você não me ame, mesmo que seja só para me ver sorrir, ou apenas por
essa noite... obs: até o amanhecer estarei lhe esperando na praia que nos
conhecemos, depois disso, volto para o mundo”. E saiu da casa, sem fechar a
porta, ainda de vestido e com o copo de vodca na mão.
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