quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Wicked Games


A maioria dos presentes ainda estavam nas caixas, o vestido branco e o penteado no cabelo ainda não tinham sido tirados. Ela, sozinha, em casa sentou entre as caixas e começou a desembrulhar. Um liquidificador, conjunto de facas, toalha de mesa e pequenos objetos de decoração. A casa era linda, assim como tinha sido o casamento. Não era o primeiro, mas como nunca havia casado no religioso, dessa vez, resolveu fazer como manda os planos sociais. Não fora na igreja, única coisa que ela havia resolvido fazer diferente, pois desde criança tinha a vontade de casar na praia. Como via nos filmes da sessão da tarde. Não tinha sido uma cerimonia para muitas pessoas, porém os mais próximos do casal estavam lá. Tudo perfeito, tudo como em seu sonho de menina “fairy tales”. Mas agora com a festa desfeita, as caixas empilhadas sobre a mesa e outras no chão, seus pensamentos não a deixava sentir-se feliz. Ao pensar na felicidade, lembrava rapidamente da infância, pois era nesse período da vida que pouco era motivo para muita alegria ou tristeza profunda. Quando era criança, os sentimentos variavam muito rapidamente, porém tudo era novo então até mesmo ficar triste por perder um brinquedo, era uma possibilidade de descobrir outras formas de se divertir. Porém sentada na sala arrumando os presentes, o mais perto de diversão que conseguia ter era ver qual o presente que seus familiares miseráveis haviam comprado. Não era seu primeiro casamento, em ordem cronológica seria o segundo, fora umas duas ou três vezes que chegou a morar junto, mas sem oficializar o casamento. O último havia lhe deixado tantas marcas que mesmo estando começando uma nova relação, ela ainda não tinha todos os sentimentos recuperados e em ordem. Já cansada, desistiu de desembrulhar os presentes, pois em vez de ficar feliz por estar montando a sua nova casa, coisa que normalmente as noivas parecem ficar em filmes, ela estava ficando cada vez mais em duvida. Ao sair do meio te todos os presente, percebeu estar de frente ao espelho.  Talvez ela conseguisse mentir para se mesma, mas o espelho não tinha essa obrigação, por isso ele fazia questão de mostrar a maquiagem borrada pelo choro, que ela fingia não escorrer pelo rosto. Ao ver o vestido brando todo amassado e o rosto de maquiagem espalhadas, pelas compulsivas vezes que levou a mão ao rosto para limpas as lagrimas, ela assumiu as lagrimas e ficou olhando elas escorrerem pelo rosto e mancharem mais a gola. Assumir para sim um fracasso é talvez mais difícil que assumir para os outros, ou seria tudo um montante, pois ás vezes não se assume o fracasso com medo do que os outros podem dizer, foi o que ela ficou pensando. Havia gasto tanto pela a festa de casamento, dito a tantas pessoas que estava feliz, e que havia novamente encontrado uma pessoa para dividir tudo, que assumir que não estava feliz era algo muito difícil. Mas entre o rosto amassado e o vestido sujo ela sabia que não estava feliz, pois era necessário um por favor para que eles se beijarem, uma briga para conseguir que tivessem sexo e muito cuidado para expressar carinhos. É realmente as pessoas mudam, era o que as lagrimas expressavam, enquanto sujavam o rosto.  Sentada em uma caixa, que provavelmente fosse a da televisão de plasma, e já sem lagrimas para chorar, mas com um copo de vodca para acompanhar, ela pegou o primeiro papel de presente, que tinha o verso em branco, e com a caneta preta ,que falhava um pouco, escreveu. “Saiba que quando eu disse sim eu estava disposta a dar tudo de mim. Então me diga que você me ama, mesmo que você não diga isso a ninguém, mesmo que você não me ame, mesmo que seja só para me ver sorrir, ou apenas por essa noite... obs: até o amanhecer estarei lhe esperando na praia que nos conhecemos, depois disso, volto para o mundo”. E saiu da casa, sem fechar a porta, ainda de vestido e com o copo de vodca na mão.

Um comentário:

Alvaro Soares disse...

Me lembrou o filme Melancolia. Belo texto, quando a gente é criança ou tenta pensar como uma a gente é mais feliz, o motivo é que não conhecemos muito do mundo nem das pessoas, ingênuos.