O
dia parecia normal, ele havia acordado as 5h da manhã, tomado banho, comido um rápido
café e saído para o trabalho. A empresa era sua, mas ele sempre fazia questão
de chegar antes de todos os funcionários e sair só ao final do expediente. Já não
era mais um rapaz novo e sua empresa já era bastante consolidada no cenário
nacional com filiais nas cinco regiões do país.
Já
eram vinte as onde da noite quando resolveu que era hora de sair do trabalho.
Pegou seu carro que estava na vaga de presidente e saiu para sua cobertura que
dava vista para o mar. Um dia comum. Era o que qualquer pessoa iria pensar se
tivesse lhe seguido durante o dia inteiro.
Já
em casa, uma dose de bebida, dois tragos de charuto cubano socialista e um
banho. Voltou para sala de 80 metros quadrados e sentou-se na cadeira de 50 mil
reais que havia comprado na última bienal de designe. Levantou-se e resolveu
abrir a janela. Um pouco de ar natural.
Mais
duas doses, mais dos tragos e mais experiência de solidão. Talvez olhar o mar
fosse uma forma de aliviar tudo. Levantou-se lentamente, enquanto andava passou
pela pesa de centro e percebeu que seu celular estava tocando. Olhou para o visor,
mas a decisão de ir até a varanda era maior.
De
pé, no vigésimo segundo andar, a cidade parecia pequena. As vidas que passavam
em baixo de sua cobertura pareciam mais dinâmicas que a vida que se passava
dentro da cobertura. Olhava para fora, projetava seu corpo para fora e sentia
uma liberdade. Qual seria o motivo de não pular? Pensou.
Não
encontrava nenhum. O sofrimento de sua mãe? Não essa já havia morrido. O de seu
pai? Esse nunca havia conhecido. O de seu último casamento? Desse já não tinha
mais nem as fotos. Filhos nunca teve. Então por qual motivo não fazer isso?
Parado olhando para fora, para dinâmica da vida, percebeu que não tinha nenhum
motivo.
Então,
como que em impulso patético passou os pés para borda que tinha entre o final
da varanda e o abismo. Segurando firmemente as mãos no guarda corpo, olhou mais
uma vez lá para baixo. Parecia que o abismo era dinâmico e o chamava. Uma felicidade
ele tinha. Morava na cobertura ninguém conseguiria impedi-lo já que ninguém lhe
via.
Olhou
para baixo, e nada de filmezinho, ou resumo da vida. Apenas a dinâmica em todos
os seus sentidos lhe fazia companhia e convite. Pensou pela última vez e
decidiu que iria contar até quatro e iria pular. Não queria contar até três seria
clichê de mais. Respirou fundo, como quem traga um charuto e começo a contar.
Um... Dois...Três... Quatro.
Telefone
do inferno. Isso era hora para tocar novamente? Justamente no quatro. Olhou para
traz, por cima dos ombros. Nesse rápido movimento entre o quatro, o tocar e olhar
lembrou-se. Havia combinado com um investidor internacional que lhe ligasse a
noite, pois com o fuso horário lá já seria dia. Lembrou-se dos investimentos
que iria receber, da filial que teria fora do país e da cobertura mais alta que
poderia comprar.
Foi assim, que desistiu da ideia absurda de
pular e resolveu voltar com seu corpo para dentro da varanda do prédio.
Enquanto se preparava para se virar, agora com muito cuidado e medo, uma
fisgada lhe veio ao peito. Um dor, como se tivesse uma mão pressionando seus
ossos do peito. O ar logo começou a lhe faltar e a vista começou a ficar
escura. Tinha que se concentrar. “Vamos lá: um... dois... três... quatro...”
Na
madrugada desta quinta feira, as quatro e quarenta e oito da madrugada, um
grande empresário foi encontrado morto em seu condomínio de luxo. Devido as
evidencias, os policiais afirmam que o empresário morreu após tentativa de
suicido da varanda de sua cobertura. Familiares declaram luto de um dia na
empresa, mas já alegam que a mesma entrará em leilão ainda esse mês.
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