sábado, 10 de janeiro de 2009

Vasos

Um vaso só pode ser cheio até a borda, nem uma gota a mais. Essas foram as últimas palavras que André me falou antes de cometer seu suicídio, mas não é dessa parte que eu quero começar a falar.
Um dia comum, onde se pensa que nada vai mudar, chegou, no sanatório, ou melhor, no manicômio, que trabalho, André. Não sei muito bem quem o deixou por lá, nem mesmo quis saber, pois o meu trabalho não é o de investigar a vida das pessoas, e sim aplicar sedativos e tranqüilizantes, porém em André eu nunca precisei fazer isso.Todo dia quando eu ia entregar os remédios a André, eu só precisava entregar o copo com um pouco de água e ele tomava rapidamente todos os remédio sem dar nenhum trabalho.
Era engraçado como ele ficava horas, às vezes, até o dia todo, sentado, enfrente a um espelho, apenas olhando os cabelos, de vez em quando, ele tirava algo, que só ele podia ver, e o jogava para o alto com toda a delicadeza do mundo.
Foi então que um dia, depois de não aquentar a tranqüilidade e a falta de revolta de André, resolvi fazer algumas perguntas.
- Oi sou o responsável pela medicação diária de vocês, acho que nunca conversamos. Sou Pierre. Falei que não sabia como era o nome dele, pois queria chamar sua atenção
-Só se pode encher o vaso até a borda, nem uma gota a mais. Não falou mais nada, e continuou olhando para o espelho.
Ele havia falado aquela frase com tanta força de espírito e convicção, que mesmo sabendo que ele era considerado um loco, não hesitei em pensar sobre a frase. Passei horas pensando no que ele queria dizer com a frase. Um vaso só pode ser cheio até a borda, nem uma gora a mais... nem uma gota a mais. Não sei se o entendi da mesma forma que ele quis me passar, ou se isso não era nem para se entender. O que realmente eu pude sentir foi que ele queria me falar algo sobre a tolerância, sabe as pessoas toleram tudo, até não poderem mais, ou seja, só até a borda dos seus próprios vasos, porém depois que uma gota a mais é colocada, elas acampam perdendo o equilíbrio emocional, psicológico e acabam sendo consideradas loucas, mesmo que essa loucura seja a completa compreensão do ser de uma forma metafórica. Não passam de loucas. Não sei se foi bem isso que André quis falar, por isso, não vou me prender a essa filosofia, espero que cada leitor ache sua teoria para as últimas e primeiras palavras de Andrés comigo.
Já estava saindo do manicômio , quando ouvi um barulho, olhei para traz e lá estava André. Ele havia pulado do sexto andar, mas, mesmo estando morto, ele tinha uma cara de liberdade e alegria.
Só se pode encher um vaso ate a borda e nem uma gota a mais. E lá estava André depois de receber a sua gota a mais.

4 comentários:

Anônimo disse...

Eitaaaaaaaaa!
gostei bastante!
suas ideias sempre são boas, e a metáfora do limite e da tolerância são fantásticos.
surpreendente!
não vou comentar aqui nada em termos filosóficos...
deixo o psicologico imperar aqui!
TDB!!!

birdie disse...

uma gota a mais faz toda a diferença... :*

Fiuza disse...

Sem dúvida, o texto está lindo.
O contexto em que a frase se insere tá ideal. Ótimo, Dudu.Vc caprichou!

Fiuza disse...

Tu já imaginou, Dudu, que a gota última pode tirar do vaso uma que já estava lá?
O limite da tolerância não impede
que a pessoa reveja seus conceitos, acabando por tolerar algo que é novo ou que outrora não tolerava. Pensei dessa forma tb!